domingo, 19 de fevereiro de 2017

O Aroma das Especiarias, de Joanne Harris – Opinião

O Aroma das Especiarias, de Joanne Harris

Vianne Rocher recebe uma estranha carta. A mão do destino parece estar a empurrá-la de volta a Lansquenet-sur-Tannes, a aldeia de Chocolate, onde decidira nunca mais voltar. Passaram já 8 anos mas as memórias da sua mágica chocolataria La Céleste Praline são ainda intensas. 
A viver tranquilamente em Paris com o seu grande amor, Roux, e as duas filhas, Vianne quebra a promessa que fizera a si própria e decide visitar a aldeia no Sul de França. À primeira vista, tudo parece igual. As ruas de calçada, as pequenas lojas e casinhas pitorescas… Mas Vianne pressente que algo se agita por detrás daquela aparente serenidade. O ar está impregnado dos aromas exóticos das especiarias e do chá de menta.
Mulheres vestidas de negro passam fugazes nas vielas. Os ventos do Ramadão trouxeram consigo uma comunidade muçulmana e, com ela, a tão temida mudança. Mas é com a chegada de uma misteriosa mulher, velada e acompanhada pela filha, que as tensões no seio da pequena comunidade aumentam. E Vianne percebe que a sua estadia não vai ser tão curta quanto pensava. A sua magia é mais necessária do que nunca!

Joanne Harris é uma autora à qual gosto sempre de voltar. Apaixonei-me por ela no Chocolate (acho que quase todos se apaixonaram) e continuo por todos os seus outros livros.
Quando saiu o Sapatos de Rebuçado, uma continuação do Chocolate, tive um pouco de receio. Um livro tão doce e místico poderia ver a sua história ruir com o erro de uma continuação. Sapatos de Rebuçado não decepcionou.
Não tendo uma história tão apaixonante conseguiu, no entanto, manter a magia de Vianne.
Surgiu então O Aroma das Especiarias. Outra continuação. Novo receio.
É sempre bom voltar a personagens que nos apaixonam. E Vianne, para mim, é sempre uma personagem bem vinda e à qual me habituei. Mas o receio de ver estas personagens adulteradas da história inicial está sempre presente.
Vianne volta a Lansquenet-sur-Tannes após receber uma carta da falecida Armande. Lansquenet precisa de ajuda. Alguém precisa da ajuda de Vianne. Mas quem?
Chegamos a uma vila em polvorosa. Reynaud está desacreditado junto da população desde o incêndio na antiga chocolateria, que se tornara uma escola para meninas muçulmanas.
A vila está dividida. De um lado os antigos habitantes que Vianne já conhece, do outro as famílias muçulmanas que habitam Les Marauds.
Vianne reencontra velhos amigos ao mesmo tempo que é apanhada em plena “guerra”. Reynaud, o pére, que sempre a tentou expulsar da vila, precisa agora da ajuda dela. Por outro lado Inés, a muçulmana de que todos falam, resiste à sua magia tornando-a cada vez mais misteriosa.
É bom redescobrir um novo Reynaud, uma nova faceta. E ver a sua personalidade evoluir durante a história.
Por sua vez Inés é uma personagem intrigante que leva o leitor a uma bipolaridade de sentimentos: temos pena dela, depois já não tanto e depois…. Deixo-vos descobrir…
Pelo meio a própria Vianne e as filhas, os seus sentimentos e os ventos da mudança.
Numa altura em que Trump, o Islão e os refugiados são o tema principal, O Aroma das Especiarias é um livro que nos faz pensar neste choque de culturas. Faz-nos conhecer um pouco mais a cultura muçulmana e perceber como pequenos mal entendidos podem originar guerras, derivadas do medo do desconhecido, do diferente, da falta de compreensão.
Foi bom voltar a Lansquenet. Foi bom voltar à companhia de Vianne.

Recomendo vivamente o livro e só tenho pena que a falta de tempo, e a vida, não me tenha permitido ler o livro muito mais rapidamente.